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- A fé de dentro para fora II
04 agosto 2014
Digo-vos que, depressa, lhes fará justiça. Contudo, quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na Terra? Lucas 18.8
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Jesus alerta sobre os fariseus. autor não identificado |
Seria possível, da mesma forma, que a fé pudesse sobreviver desvinculada da justiça? Antes de qualquer iniciativa de resposta seria bom observar que no nosso versículo base a crucial pergunta feita por Jesus procede da incansável luta de uma viúva injustiçada contra a injustiça e contra o descaso daqueles que deveriam promovê-la.
Pelo que me parece, o texto faz referência a uma série de injustiças, inclusive a uma bem anterior ao seu verdadeiro contexto, que é o da sociedade dar posse a uma pessoa que não reúne sobre si qualquer condição de ocupar um cargo de magistratura, não pelo fato se ser alheio à religião, mas pelo seu total desprezo pela humanidade. Segundo a narrativa é o próprio juiz quem assim se apresenta: Lc 18.4 - Bem que eu não temo a Deus, nem respeito a homem algum.
Imaginar que possa existir justiça desvinculada de uma paixão incondicional pela causa humana, já é algo bastante difícil de aceitar, embora isso seja frequente nas manchetes dos jornais de hoje em dia. Que diríamos, então, se a igreja não considerasse o padrão mínimo de justiça exigido pela fé em Jesus Cristo? Em uma ocasião em que o assunto da justiça nas relações do cotidiano estava sendo abordado, Jesus estabeleceu que esse critério mínimo seria a justiça praticada pelos fariseus: Mt 5.20 - Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus. E acreditem, eles eram mestres no campo do direito. Seu código de conduta tinha nada menos que seiscentos e treze mandamentos, sendo que trezentos e sessenta e cinco deles eram coercitivos e sua observação exigia constante vigilância.
Mas não é o que acontece conosco. É bem possível que nem mesmo o mais bem elaborado discurso do mais hábil transgressor da Palavra de Deus consiga fazer o que já o fazemos na prática. Com a recente passagem do mestre Rubem Alves, temos que começar a nos perguntar: Onde estão aqueles poucos dentre nós que se levantam contra todas as formas de injustiça, porque vivem na angústia de não poder conceber que na sua volta o Filho do Homem encontre a justiça exigida pela fé que ele promoveu relevada a um plano secundário?
É aqui que começa a pairar a desconfiança dos incrédulos, dos ateus e dos agnósticos sobre nós e sobre a nossa fé. E essa é uma desconfiança mais do que justa, porque o nosso afrouxamento com as causas mais simples foi o que permitiu o engajamento mais íntimo dos nossos representantes, sejam eles protestantes ou católicos, as chamadas bancadas religiosas da Câmara e do Senado, com a corrupção flagrante e vexatória da qual somos testemunhas. Menos mal seria se esta fosse uma condição transitória, como espera a maioria dos eleitores. Mas a verdade é que isso projeta uma nuvem obscura e ameaçadora sobre o futuro do nosso país. Recuso-me sequer a imaginar que, caso um dia a profecia de alguns incautos venha a vingar, e aquela cambada de iníquos que representa a igreja passe a deter o poder absoluto no Brasil. Espero que Deus me livre de estar vivo no dia em que esse sonho evangélico se transformar em um pesadelo infernal.
O Filho do Homem, porventura, achará fé na Terra? A pergunta é exigente demais para os nossos padrões atuais. Com que cara vamos respondê-la se o nosso coração não está voltado para tamanha empreitada, se o nosso espírito não responde aos apelos dos injustiçados, e não nos esforçamos para fazer cumprir e nem para cumprir o mais básico de todos os mandamentos: Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e com todas as tuas forças. (continua)
O Filho do Homem, porventura, achará fé na Terra? A pergunta é exigente demais para os nossos padrões atuais. Com que cara vamos respondê-la se o nosso coração não está voltado para tamanha empreitada, se o nosso espírito não responde aos apelos dos injustiçados, e não nos esforçamos para fazer cumprir e nem para cumprir o mais básico de todos os mandamentos: Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e com todas as tuas forças. (continua)